sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Lembranças de Juju II

Aproveito a oportunidade de estarmos próximo ao período de carnaval, quando, involutariamente, vamos pouco a pouco nos animando, para dividir com vocês uma visão nostálgica dos carnavais de alguns anos passados, transcrevendo parte de um texto de minha lavra, que escrevi em outra ocasião. Vamos lá!, sejam tolerantes:

Lembranças de Jujú II
Na carreirinha dos pensamentos, topamos involuntariamente, aos encontrões, com imagens já esmaecidas pelo transcorrer dos anos; e cenas vividas nas curvas do tempo, tomam forma e surgem de lugares obscuros, onde devagarzinho se meterem, como que por encanto. Lá, escondidinhas em recôncavos, encontram-se, mantendo-se em estado de latência, como se estivessem verdadeiramente esquecidas. Até que, a espanar a poeira dos movimentos atmosféricos, nas calmarias e nos temporais, ou mesmo camadas de poeiras cósmicas, estas imagens apagadas ganham vida readquirindo cores vivas, revitalizando antigos movimentos. Quando isto acontece com uma única pessoa, chama-se de: memória; quando acontece com um grupo de pessoas, diz-se tratar de: uma consciência ou memória coletiva. Assim sendo, coisas e fatos que julgávamos mortos, readquirem vida com relativa facilidade, motivada muitas vezes por situações que acreditávamos fúteis; no entanto fortes o suficiente, para servirem de catalisador nestas fantásticas reações de ativação da memória. Dito isto, mais uma vez, surpresos sobremaneira, lernbramo-nos, de forma descompromissada, de criaturas enigmáticas que atendiam pelo nome de Jujú.
Abre-se aqui um parêntese: (Transcorria, naquela época, nos grandes redutos habitacionais do nosso País e nos quatro cantos do mundo, sinais visíveis de mudanças. Algumas rompiam em definitivo com os usos e costumes, valores culturais - alguns , eram no entanto, remanescentes da idade média - adotados e cultuados até os anos sessenta do século passado. Aquela década serviu de divisor de águas, onde e quando rompeu-se compromissos, sufocaram, sem maiores cerimônias, aspirações de uma juventude ainda inocente; meteram goela abaixo, contra a vontade dos jovens, uma guerra longa e covarde contra um País asiático, paupérrimo e distante. Por conta daquela inexplicável pirotecnia bélica, surgiram, naqueles anos, os movimentos pacifistas, as sociedades alternativas e, à reboque, arroubos inacreditáveis de uns poucos praticantes da "contra cultura". No nosso País essas mudanças foram respostas a este estado de coisas, e denuncias emblemáticas contra a bazófia de alguns brasileiros que engendraram ou apoiaram um desenxabido “Golpe de Estado” , jogando por terra, embora que temporariamente, o nosso precário Estado de Direito. Na nossa cidade, arruado teimosamente encravado no semi árido dos sertões Nordestino, algumas destas novidades apesar de chegarem até nós com sua força bastante arrefecida, fizeram, entretanto, alguns importantes e irreversíveis estragos. É bom e necessário, no entanto, que se diga, que mesmo no meio daquela efervescência sócio cultural existente naqueles dias, vivíamos nos nossos lares a vidinha simples de sempre, que pouco diferia do dia a dia dos habitantes das pequenas aldeias; sem contato com drogas e as discussões políticas nunca ultrapassaram os limites dos palavrórios.
Assim vivíamos naqueles anos, com restos de tradições, algumas herdadas, quase na sua totalidade, dos nossos ancestrais Ibéricos.
Depois destas visões rapidamente intercaladas, de momentos, hoje fugazes, dos anos sessenta, fecha-se o parêntese ).
Jujú traz-nos, inapelavelmente, o registro de um cidadão que atendia por este nome; sendo no palmilhar do seu tempo, participante ativo dos movimentos e tradições populares da cidade de Caicó, destacado centro urbano dos sertões Nordestino. Era um sujeito de aspecto Catalão, moreno de basta cabeleira, cabelos negros e ondulados; sobrancelhas grossas guarneciam olhos escuros e miúdos, repuxados e levemente vesgos. Usava óculos com lentes grossas. As maçãs do rosto eram salientes, que junto a um bigode aparado, em fino, por cima de uma boca grande, davam forma a profundos sulcos naso-labiais. Tal face se completava com: alguma falha dentaria e, um rnento encorpado junto à urna reforçada mandíbula. Tinha uma estatura mediana e um tronco relativamente fornido.
Assim sendo, como uma fênix retorna à vida, volta-nos à lembrança o seu aspecto fisionômico. Consta-nos que, este popular ganhava a vida com uma marcenaria rudimentar e amadora; como também amador era o seu segundo ofício: tocar trombone; se é que assim podíamos norninar àquela bem intencionada algazarra sonora. O seu instrumento musical era um artefato cansado pelo excessivo uso e pelo tempo; em quase tudo parecia com um doente terminal; era muito oxidado e, aqui e acolá havia um remendo de esparadrapo. Daí, em parte, o motivo da sua pouca sonoridade; na verdade já devia estar inativo há algum tempo, assim preservando a boa figura de um dos "reis dos metais". Ficando na tutela de Jujú trabalharia até desintegrar-se; não tinha outro jeito. Jujú adorava tocar trombone..., não tinha, entretanto, o gabarito - talvez por não conhecer teoria musical - de formar na Furiosa - alcunha carinhosa da Banda de Música Recreio Caicoense. Suas atividades resumiam-se a animar periféricas gafieiras, alguns comícios de candidatos pobres, temporadas em pequenos circos e, verdadeiras maratonas no período do carnaval. O reinado de momo era um período de “vacas gordas” para músicos de pouco talento, como aquele humilde - notadamente bastardo - filho da pauta.
Jujú e seus pares, em companhia de animada trupe de Papangus, abriam o carnaval de rua acordando a cidade na madrugada do Domingo momêsco, ao som de uma meia dúzia de antiqüíssimas e consagradas marchinhas, num animado Zé Pereira. Eram, naqueles momentos, os arautos da alegria...! E aí vinham com: "mamãe eu quero"; "sapo não lava o pé"; "garota bossa nova"; "ô jardineira"; "doido também apanha"; "touradas em Madri"; "vassourinhas", etc., etc., etc. Nas tardes daqueles dias, aquele alegre senhor participava da charanga que puxava alguns blocos de sujo, como: o Ala Ursa, organizado pelo popular Genival Maleiro, que era carinhosamente chamado de: Bloco do Lixo! Terminava, é preciso dizer, naqueles dias de entrudo, por animar às noitadas de alguma boate da zona do baixo meretrício, alegrando, certamente, aos freqüentadores contumazes daqueles antros.
Bons tempos, aqueles...; hoje, infelizmente, apenas fugazes lembranças...!
Natal-RN 22 de Fevereiro de 2002
Gibson Azevedo da Costa
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