segunda-feira, 20 de julho de 2009

Eram mansos, os loucos de minha terra.

Faço um brinde a vocês, meus caros e pacientes leitores, com uma singela crônica feita, à toa, há alguns anos...

Eram mansos, os loucos de minha terra !
Geralmente eram. Salvo, raríssímas exceções de uns poucos mais enfezados; daqueles que jogavam pedras nos meninos, em resposta, troca, a certos insistentes chamamentos chistosos de odiados apelidos mordazes, feitos por estas turmas da segunda infância, e cujas estrepolias faziam o contraponto na quebra da monotonia daqueles lugarejos ermos, perdidos no passado; vivos apenas nas reentrâncias da memória; teimam, no entanto, como um moribundo que luta para manter-se vivo, a todo custo manter a sua história. Outros não!, não esboçam a menor irritação ao serem abordados. São loucos mansos, destrambelhados da bola - à grande maioria. Pacatos por natureza!... débeis mentais, retardados - como queiram. O Capitão José Alves da Costa, meu avô, sertanejo de boa cepa, experiente, de anos bem vividos, definia com muita justeza às pessoas que apresentavam os denunciantes indícios de retardo mental. "Meu filho! - dizia ele -, "essa pessoa nasceu e cresceu "atrufiada"? Coitado!...” Destas assertivas, por vezes, até alguns parentes chegados, não escapavam. Nas famílias mais antigas destes lugarejos de desbravadores, vamos sempre encontrar, algum indivíduo com alguma desordem física ou mental. Feitas às observações, deduziu-se, por longas experiências no decorrer de anos a fio - centenas deles -, que tais fatos aconteciam e acontecem devido a casamentos ou acasalamentos entre parentes muito próximos, onde os malefícios consangüíneos de tais junções, se fazem notar implacavelmente. Resultado: abilôlados, aos montes! Vítimas, como vimos, do desejo incontrolável do homem em ocupar novos espaços, em regiões remotas, de pouco ou nenhum contato com o mundo civilizado. Os casamentos, então, eram efetuados e celebrados no seio da parentela, frutos do mesmo ambiente. Tais himeneus ou mancebia, resultavam por vezes em prole frustrante.
* * *
No meio destas "peças com defeitos de fabricação", vamos encontrar nos primeiros lustros do século XX a presença impar do impagável Mane Télo. Este cidadão, "doidelo" por natureza, analfabeto, tinha o corpo pequeno e magro; de tez branca (à galega) queimada ao sol. Era incapaz de assumir qualquer atividade laboriosa; vivia, como era de se esperar, da caridade dos seus contemporâneos. Gozava de livre acesso às Fazendas e aos Sítios das várias cidades da região de Seridó Norte-rio-grandense. Existem dúvidas quanto ao local do seu nascimento. Alguns acham que ele nasceu para os lados da Fazenda São Roque, entre os municípios de Jardim do Seridó e Ouro Branco. Outros discordam, dando-lhe outra origem. Mané Télo era um vivente muito engraçado e perspicaz ao seu estilo. Afora alguns impropérios que distribuía aos meninos vadios, que, como vespas, o incomodavam com achincalhes e "pantíns", passava o tempo falando consigo mesmo a respeito de palpites de jogo de bicho: "sunhei cum arubú, o bicho de hoje é águia ou avestrui!” “Topei cum gato preto, hoje dinoite dá lião" E assim, ensimesmado num convercê íntimo, passava horas a fio numa algaravia medonha.
Apesar de maluco, possuía o dom da poesia; era um poeta popular e fazia com facilidade algumas "quadrinhas".
Certa vez - falam as bocas do domínio público -, vinha Mane Télo deslocando-se, a pé, como de costume, na zona rural de um Sítio para outro, quando encontrou-se com um menino muito feio. Imediatamente Mane indagou de quem ele era filho, obtendo como resposta que era filho de Mané Garcia. Passou-se..., seguiu em frente..., lá mais adiante, encontrou outro moleque que era mais feio do que o anterior. Perguntou-lhe: - você é fie de quem? Sou fie de Mané Garcia - respondeu-lhe o fedelho. Seguiu caminhando, no seu monólogo íntimo, quando por trote do destino topou com mais um filho de Mané Garcia que, se é que podia, era ainda mais feio que os dois primeiros. Tabulou uma conversa, e, quando descobriu quem ele era, saiu-se com este "repente"- uma pérola:

“Buraco em pau é oco,
Gancho de pau é furquia:
Toda “marmota” quêu vejo
É fie de Mané Garcia!...”

Doutra feita, fato relatado pelo Sr. Francisco Godofredo, da cidade de Caicó, Mane Télo chegou a um determinado Sítio, quando o proprietário, por farra, sabedor da inapetência para o trabalho ( preguiça ) que aquele desmiolado era portador, mostrou-se muito alegre ao vê-lo, dizendo que a ocasião daquela visita era muito oportuna, pois ele estava precisando de uma pessoa para carregar umas linhas, de um determinado local pra outro da sua Propriedade: - Você faz isso pra mim, Mane ? - perguntou o rurícula.
- Faço, - respondeu Mane Télo, de pronto.
Deslocaram-se, junto a outros curiosos, para um armazém onde se encontravam guardadas várias linhas e troncos de carnaúbas, coqueiros, angicos, etc., e lá, apontaram para os pesados toros de madeira e disseram: - Pronto, Mané, pode começar a carregar!
- Naã!..., eu pensei quéra linha de CARRITÉ!", - respondeu, na bucha, o sabido Mane Télo, apesar de maluco.
Natal-RN, 13 de Dezembro de 2005.
Gibson Azevedo da Costa

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Debut no sarau poético

Senhores..., senhoras meus saudares...
Sou Gibson Azevedo da Costa, Cirurgião dentista radicado nesta belíssima cidade há precisamente quarenta anos. Tenho por Natal uma paixão especial, só encontrada nos raros casos de pura mancebia, por vezes, de trágicos desdobramentos. Mas na poesia tragédia é o que não falta; e é bom que assim continue, pois como disse certa vez o poeta Chileno Pablo Neruda: fazer poesia, nada mais é do que enxergar as verdades onde elas existam, geralmente indignando-se com o status quo, e, externando-as com metáforas sucintas e precisas. Na realidade, o poeta não tem necessidade de ser simpático, de ser bom; ele tem, tão somente, a obrigação imutável de ser verdadeiro. Aí teremos uma poesia! Aí teremos um poeta.
Recebi do colega e amigo Rubens Barros de Azevedo, há algum tempo, o convite de participar deste simpático sarau; o que faço agora com muito gosto. Dizeres populares já não alardeiam, que: antes tarde de que nunca? Pois bem, “eis me aqui...., se vos sirvo aqui estou” , como já dizia, alhures, um certo poeta Russo.
Já que aqui estou, aproveito a oportunidade para demonstrar que a poesia pode apresentar-se de várias maneiras; e não será por isto: uma maior ou menor poesia. Exemplifico com dois poemas meus, que os fiz muito a propósito na forma de versos livre e também na forma metrificada e rimada. Vejam que dizem a mesma coisa, só que, com os arranjos diferentes; sem, contudo, perderem a emoção. Chamam-se: Ação do tempo...

Para o meu desgosto
O tempo passou...
Deixou marcas no meu rosto,
Mas não foram as mais profundas.
Conservou feridas abertas
Que pouco percebe-se no entanto;
- São as que verdadeiramente doem.
Surpreendo-me pensando...
E o tempo, mais e mais, passando...
O que restou?... Nada..., quase nada...,
Marcas no rosto,
Para meu desgosto!

Natal-RN 17/11/ 2006
Gibson Azevedo - poeta


Vejo o ocaso chegando,
No Tempo, penso e medito:
Este déspota maldito,
Que mais e mais vai passando...
Intimamente marcando,
Deixando, a contragosto,
Perplexidade e desgosto,
Numa existência fanada...
Restando, bem pouco ou nada:
Tristeza e marcas no rosto!


Natal-RN, 06/12/2006
Gibson azevedo-poeta
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...