sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Bestialidade

Para vocês, com carinho, mais um "causo" antigo:


... Pois bem, havia ao redor do Mercado Público, vários quiosques que a princípio venderiam somente café, mas que, desvirtuando a sua finalidade, vendiam bebidas alcoólicas e pequenos repastos de comidas típicas. Eram locais para se fazer um lanche rápido e tomar uns poucos tragos, de afogadilho. O que não impedia de alguns freqüentadores pó ali permanecerem por um tempo maior do que o habitual. Lá também se encontrava, desde cedo, do turno da manhã, uma mulher... Era uma mulher jovem e mestiça, de tez morena, contava com uns vinte e dois anos de idade, aproximadamente. Vestia-se com a simplicidade das jovens pobres daqueles tempos..., um vestidinho de chitão com algumas estampas, já surrado pelo o uso, dando sinais que já estava curto devido a um possível engordar da sua dona. Mulher simples..., sem pinturas no rosto. Calçava uns chinelos de borracha, muito comum naqueles dias. Bem se via que chegara cedo àqueles quiosques, ingerindo, ao passar das horas, várias doses de bebida; já falava alto e proferia com desenvoltura, aqui e ali, algum palavrão. Foi o suficiente para um meganha, novato e despreparado, dar voz de prisão àquela representante do sexo feminino, pobre e desbocada, que vivia aos caprichos do acaso. Esse meganha não calculou, antes de tomar aquela atitude, que aquela jovem era uma sobrevivente e não trocaria sua liberdade por nada neste mundo. Mandou o soldado às favas e o nomeou, para que todos ouvissem, de: “filho desse e filho daquela”... O inexperiente militar, sendo branco de nascimento, ficou rubro de raiva e sacou o porrete para agredir sua desafeta que, para sua surpresa, desferiu-lhe no rosto um tabefe cruzado, de mão aberta, derribando-o e arrancando-lhe fora o capacete. Este artefato do fardamento policial, feito de certa fibra resistente, tinha o som de cabaça seca quando era percutido. Ora, o citado capacete saiu quicando no calçamento da Av. Seridó, tamborilando uma sonoridade incomum àquele cruzamento das duas principais artérias públicas daquela cidade (Seridó, com a Cel. Martiniano). Naturalmente, chamou a atenção dos transeuntes. Juntou muita gente, aquele estranho pugilato. O meganha levantou-se possesso, cego de ira, deu-lhe umas duas bordoadas que tiveram como resposta outro tabefe, este, na ponta do queixo, que quase o leva a nocaute, com pernas e coturnos aos ares. A mão daquela jovem era pesadíssima!... Onde batia, não nascia mais cabelo - fazia um estrago terrível... Infelizmente, devido o seu estado de embriaguês, toda vez que ela derrubava o seu contendor desequilibrava-se e machucava-se na aspereza do solo. O soldado, no entanto, não desistiu e conseguiu acertar umas fortes pancadas na mulher, minando suas forças, deixando-a a mercê de sua sanha. As roupas rotas da pobre criatura, depois de alguns instantes, não mais cobriam as suas vergonhas... Era um massacre..., e não devia, nem poderia continuar. Foi aí que apareceu a solidariedade humana, tão incomum nos nossos dias:
Um senhor, de idade madura, interveio em favor da desvalida mulher, segurou o jovem soldado que, esbravejando, perguntou: Quem era ele para interferir no seu trabalho.
- O Senhor quer ser preso também? Afasta daqui véio, ou eu lhe prendo! - Muito nervoso, mas sem demonstrar medo, o cidadão disse:
- Não Senhor, Soldado, na minha terra não se bate em mulher..., não Senhor!... Tome vergonha e pare com essa coisa feia! Bem se ver que você não é daqui. Porque, aqui, homi num bate em mulher, não! Respeite-me que eu, sou Presidente da Câmara Municipal de Vereadores, represento o povo desta cidade e não admito uma carnificina destas em pleno centro de Caicó. Ou você para, ou eu lhe garanto que você perde a sua farda! (Naqueles tempos, quando se falava em perder farda – ser expulso da Corporação - todo milico tremia de medo.)
- Mas, ela num quer ser presa!... – grunhiu, humilhado, o desarrumado Soldado.
- Num sei, não! Batendo assim, você num leva!... – garantiu, o convicto Edil. Neste momento, surgiu Dona Isaura, proprietária de um hotel nas proximidades; correu com um lençol, envolvendo-a; abraçou caridosamente àquela massa sanguinolenta, limpando-a e cobrindo sua nudez.
- Minha filha! Vamos pra delegacia, pra você num apanhar mais!... Eu vou cum você e falo para o Delegado lhe soltar! Vamos, mulherzinha!... - assim portou-se a piedosa mulher, em solidariedade àquela desventurada, ali, tão miseravelmente humana..., tão nossa irmã...
Naquele momento, a vergonha veio-nos com o seu ranço inconfundível... A todos, por que não protestamos...
Quanto à citada mulher, levaram-na à presença do Delegado que, admoestou-a, puramente por rotina... Aquela pobre criatura nada devia a sociedade. A humanidade, sim! Tinha, para com ela, uma dívida imensa..., e impagável!
Deste episódio, que os meus “olhos meninos” testemunharam, restou-me a certeza que naqueles tempos, algumas pessoas de bom coração não hesitavam em se expor na defesa dos menos favorecidos. Infelizmente, esta benéfica prática do coletivo humano, no nosso país e em algumas outras paragens, perdeu-se no tempo.


Natal-RN, 29/ Jan./ 2010.
Gibson Azevedo – poeta.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Notícias de Marivaldo

Hoje, venho prazerosamente mostrar um pouquinho do personagem, do meu querido amigo e destacado poeta Marivaldo Ernesto dos Santos. Cabra bom, sertanejo oriundo da parte paraibana do Seridó, na micro-região do rio Curumatau e também ribeiras do rio Acauã. Homem brilhante, porém, como todo artista, é incompreendido por parte daqueles que o conhecem. Ou não o conhecem com profundidade... , daí não perceberem a grandeza do seu coração e a avidez infinita por novos conhecimentos; e a praticidade da rapidez do seu brilhante raciocínio. Marivaldo, na sua imensa bondade, jura com segurança que ainda somos primos. Talvez ele tenha razão. Afinal, todos no seridó terminamos por sermos resultado do cruzamento de umas poucas famílias, que desbravaram aquelas terras nos primórdios da nossa Nação. Somos todos aparentados.

Outro dia, recebi um email do grande vate do Cuité, que cuidava, entre outras coisas, da saúde daquele seu organismo sexagenário. Achei-o interessante. Observem:



De:

marivaldo ernesto dos santos
Para:
Os amigos e o mundo
Data:
Quinta-feira, 14 de janeiro de 2010 17h56min.

"Não vou morrer do juízo como queria Juvino Pereira, que aconselhara Lula Bostino a me internar em Pindobal, para curar minha loucura; como fizeram com Jário Souto, meu irmãozinho. Fui salvo por Dr. Manoel Guimarães que me internou na LUBIANCA do Salesiano do Recife.
Não vou morrer do coração, depois dos reparos feitos pelo Dr. Cleanto; que lubrificou as porcas, stentes, arruelas e arrebites do relógio velho...
Não vou morrer de câncer..., depois da capação prostática feita com sucesso pelo Dr. Bastos. Nem vou morrer de outras murrinhas, pois que, estas, sei curar com mastruz, limão e reza.
Não vou morrer de piorréia, depois que Dr. Givaldo Soares, revisou a cacaria.
Vou morrer, sim! Dos cigarros que fumei há vinte anos atrás!
Pode ??? Puta que o pariu!!!
Já ameacei a minha pneumologista:
Se ela não resolver meu problema, eu vou procurar EDIR MACEDO... Ou talvez, procurar Chica Caxiado.
Vou mesmo!!! Se vou?"

Natal-RN, 20/Jan./2010.
Gibson Azevedo - poeta.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Desabafo

Certo dia, com intuito de me provocar, já que me considero (e algumas pessoas têm ciência) um poeta bissexto, o meu dileto amigo - um irmão que escolhi -, Antenir de Oliveira Neves, atiçando a minha ira, sem cerimônias comentou, que: a minha poesia era de uma expressão decadente...; diria mais, que estava morta, etc. , etc. Mortificado fiquei então, e, como uma Fênix, ressurgi violentamente lépido no pensar, e minha lira cantou altos brados de protestos: - aqui me encontro!... Não morri! Posso até ter fenecido, mas não morri... E posso provar! Ora, quando apresentei o meu desagravo poético ao citado amigo, este, sorriu feliz e, maroto, comentou: “- o meu objetivo foi alcançado. Isto é você novamente... “

Aí está:

Desabafo

Falso Juízo à minha Lira...
Tipificam-na, sem escrúpulos, de: “Doente”,
Decadente na essência e na origem,
Fuligem de sandices que ao acaso
Medram...
Haveria justeza neste pensar?
Quem dera!...
(Pondera de pronto, minha vontade).
Deveras, ponho “Justas” àquele Julgar:
Anseio o dia, incerto talvez,
Que meus olhos poetas vejam...
E sintam...
Coisas que a muitos encantem...
E que meditem..., devagar,
Tresloucados de verdades
Com tal canto duradouro...
(Isento de bazófias e dizeres douro...)
Que, porém não alcançarão, decerto,
Aos que julgam-na decadente;
Incapazes, que são, de ouvir
O sussurrar inequívoco das Musas!...
(Assim espero. Talvez, em mais dias,
Aconteça...)




Natal-RN, 01/Mar./ 2007.
Gibson Azevedo – poeta.
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