terça-feira, 23 de junho de 2009

Algumas reflexões

Habemus Stadium

Na falta de expressão melhor, sirvo-me desta, oriunda da língua mãe que, bondosa e abrangente como é, nunca nos falta, mesmo para nomear fatos novos; ocasião na qual os mais posudos e modernos léxicos encontram dificuldade de dar-lhe o real significado. Então, encontramos, no bom velho Latim, resposta para os fatos mais estranhos e alienígenas que possamos se nos deparar.
Habemus Stadium – esta expressão só agora veio à tona depois de muitos convercêres (convícios conversíveis) que se nos expuseram, às tulhas, nas últimas semanas, após o pirotécnico anuncio dos nomes das cidades sedes para a Copa do Mundo de Futebol do ano de 2014. Ora! Vivas! Foi o que todos disseram... Todos entrementes só olharam para o próprio umbigo; só, e somente só, pensaram nas próprias vantagens que podiam subtrair da notícia inusitada. Não se teve naquele momento o mínimo de humildade; a soberba assomou-se-lhes aos pensamentos, adonando-se dos seus seres. Todos, demonstrando exímio preparo, encontraram resposta para tudo: “Faremos isto; faremos aquilo; demoliremos tal estrutura; ergueremos a tempo tal projeto...; o problema da infra-estrutura de tal setor já está parcialmente solucionado, etc. etc.
Bem, ante a azáfama de pensamentos que nos veio em turbilhão e fomos obrigados a testemunhar, passada a euforia inicial, ouso proferir uma pergunta que teima em não calar:
Que seria do nosso débil e hesitante futebol, se, meio a essa parafernália de opiniões e de ego massageados ou melindrados, não existisse, e em boas condições de uso, o Estádio Maria Lamas Farache – O Frasqueirão?...
Aventou-se em demasia, idéias, as mais estapafúrdias como: o nosso principal confrade, o América, construir, num galope contra o tempo, o seu próprio Estádio (Nada contra, a não ser a inconveniência do momento); adequar com sensível e operosa reforma o Estádio do Potiguar de Parnamirim( o Ten. Luiz Gonzaga) e, ou o America ceder, parte do seu terreno do Centro de treinamento, para o Prefeitura de Parnamirim construir um Estádio com a capacidade para vinte mil pessoas. Lembrou-se também que a prefeitura de Macaíba,outra cidade da Grande Natal, concluiria a tempo o seu Estádio já em processo de construção; outra idéia, logo descartada, foi utilizar um Estádio na cidade de São Gonçalo(o Luiz Rios Bacurau), mas este localiza-se em uma fazenda, distando alguns quilômetros do centro da referida cidade.
Lembrou-se inclusive dos velhos e obsoletos Estádios: o Senador João Câmara (nas Rocas) e o Gov. Juvenal Lamartine (no bairro do Tirol). Nenhuma destas, supracitadas hipóteses, resistiria a uma análise isenta. Nenhuma! Algumas, pelo o incômodo de localizarem-se em outro município, e, em alguns casos, cuidar de empregar dinheiro público em uma propriedade privada. Outras, por deficiências operacionais, devido às péssimas localizações na realidade dos tempos atuais. E por aí vão, e foram, às luminosas idéias se desmiligüindo ante a cruel veracidade dos fatos.
O Estádio João Machado encerra suas atividades ao final deste ano; data marcada para o início de sua derrocada. Não havendo tempo e nem recursos financeiros para nenhuma destas pseudo-soluções, voltou-se a analisar, o que, na cabeça de muitos indivíduos radicais, seria uma conduta impensável: Usar, neste período de construção da nova praça esportiva, o Estádio do seu adversário – O Estádio Frasqueirão. Existe algum mal nisto? Observa-se algum demérito nesta atitude? Algum clube vai sentir-se diminuído por mandar seus jogos naquele moderno Estádio? É lógico e palpável que não!... O ABC Futebol Clube, no que tange a sua diretoria, seus conselheiros e seus torcedores, sentir-se-ão, por demais, honrados, em receber seus confrades de tantas e passadas disputas, nas suas acolhedoras instalações, pois que sabem estar a fazer História. Nada é mais gratificante! Sem falar no retorno financeiro que isso trará à equipe alvinegra; afinal de contas, as agremiações que utilizarem o Frasqueirão não o farão gratuitamente.
Sou de uma época, na qual presenciei, em algumas domingueiras promovidas pelo ABC, na sua antiga Sede Social da Rua Afonso Pena, que fazia esquina com a Rua Potengi, no Bairro de Petrópolis, quando por lá apareciam alguns dirigentes do America, estes eram especialmente bem recebidos, e suas presenças anunciadas via serviço de som instalado para aquele evento. Nada mais natural!... Da mesma forma posso afirmar e testemunhar, a gentileza que acontecia quando o fato ocorria nas dependências do América. Lembro bem, quando, por ocasião do casamento de Ricardo Siminéia, a recepção feita aos convivas aconteceu nas instalações do América Futebol Clube, no andar superior onde se localizava o restaurante daquela agremiação. Natal, naquela época, não possuía locais condignos para receber um razoável número de convidados. O America era o local preferido àqueles dias. Pois bem! José Newton Siminéia, seu pai, foi por longos anos Tesoureiro do ABC F. C., sendo um dos seus mais ferrenhos torcedores, em décadas passadas. Quando este se dirigiu à tesouraria do América, para quitar o compromisso do aluguel do espaço usado na recepção do casamento do seu filho, recebeu, pasmem os senhores, a seguinte resposta do Conselheiro Humberto Nesi: “Minéa , você acha que a gente é capaz de cobrar o aluguel do clube para o casamento do seu menino? Qué isso Minéa!, para nós é um prazer colaborar com essas bodas!..” – respondeu com sinceridade, aquele nobre alcaide do America Futebol Clube.
Estes são os meus depoimentos... Nunca pôde nem poderá haver o claro sem existir o escuro..., lembremo-nos disto!
Habemus Stadium! Que na realidade pertence a toda a sociedade natalense, pois foi uma obra concebida e executada por abnegados homens da terra de Poti, para nos servir, receber e abrigar a todos quantos procurarem as suas instalações, para a prática de um esporte tão querido qual o Futebol. Rivalidades haverão sempre. E é bom que continuem existindo para o bem e o viço do nosso amado esporte.

Natal-RN, 23 de junho (um friozinho chocho!...) de 2009.
Gibson Azevedo

sábado, 13 de junho de 2009

Apôis, têje prêso!

“Apôis, têje preso!”
(palavras do nefelibata que prendeu o Comendador)
Quis o destino nos seus imprevisíveis e caprichosos quereres que somente a pouquíssimo tempo eu tivesse a oportunidade de conhecer uma interessante e singular figura humana. Um sujeito folgazão, insinuante sob a égide de um bom papo, franco em demasia, distribui, nas ante-salas da boemia, locais nos quais mantém rotineira presença, o brilho inequívoco do seu caráter e a gostosa mansidão do seu temperamento. Um homem sereno... Trata-se do hoje Advogado Benevaldo Silva Lourenço (o Dr. Bené, de respeitável atuação nos meios jurídicos do nosso Estado). Apesar de ser um homem bom e sem maldades, não é de forma alguma um inocente. Mas, Já foi! Em dias idos, como todo jovem, era um imaturo e despreparado que cometeu, como todos na sua pouca idade, desatinos, destemperos, que seriam indesculpáveis em existências mais maduras. E esses frutos da imaturidade, ele os cometeu...
Seus pais, em décadas pretéritas, migraram com os filhos para o Estado de São Paulo em busca de dias melhores; por lá residiram uns bons pares de anos. Como conseqüência, alguns filhos - os mais velhos -, com eles não retornaram ao Nordeste, precisamente ao estado do Ceará.
O tempo passou e o Jovem Benevaldo já servia o Exército Brasileiro... Por este motivo era muito considerado em sua comunidade. Lembra o bem humorado Bené, que quando comparecia a um “arrasta pé” na sua cidade, não deixavam que ele pagasse despesa alguma. Tratavam-no como se fosse uma autoridade! Dias depois, comunicou ao seu velho pai que estava “dando baixa” do Exército, mas que ele não se preocupasse, pois estava “sentando praça” na policia militar. “- Na puliça, meu fio! Logo lá?” – perguntou surpreso, o velho sertanejo. “- Né milhor você ir pra São Paulo e arrumar um imprêgo, como seus irmãos, Não?” – insistiu com veemência, o experiente cidadão. Nada demoveu Bené do seu intento; ingressou, nos anos setenta, sem dar ouvidos aos conselhos do seu genitor, na gloriosa Polícia militar do Rio Grande do Norte.
O soldado raso Bené, segundo ele mesmo comenta, era enquadrado em demasia, seguindo à risca as ordens superiores; chegou ao ponto de, se encontrasse alguém fardado, sem observar nenhuma diferença na patente, bater continências até para guardas-noturnos...
Tudo parecia correr com tranqüilidade, sem maiores sobressaltos. Entretanto, certa noite, aquele solícito novato, tendo sido requisitado naquele dia a compor o pelotão da Radio Patrulha, cumpria nervosamente o seu plantão, quando o Praça do rádio anunciou: “Vamo, Vamo, vamo!... Pintou sujeira num Cabaré! Avie! Ligue a sirene e toque a viatura pra Zona!”
Quando a rural da polícia estacionou em frente à boate de propriedade de um proxeneta chamado David, na Av. Romualdo Galvão, apareceu uma récua de mulheres dizendo esbaforidas: “que se tratava de um velho que havia bebido muito, mas não queria pagar a despesa”. Ao encarar o suposto bêbado, Bené, querendo mostrar serviço, instava-o a pagar àquela conta... O indivíduo calado, muito calmo, fumava seu charuto como se nada estivesse acontecendo. Foi aí que Bené deu voz de prisão ao velho meliante e o encaminhou para o interior da surrada rural. Não antes de tomar-lhe, bruscamente, o charuto e o apagar com o coturno. “Era só o que faltava, um véio folgado desse, querer fumar, um charuto fedido desses, dentro da rural!... O senhor não tem vergonha, não? Um véio na sua idade, que podia ser meu avô..., vim pru brega, beber e beber..., e depois num querer pagar? Véi fulêro!” – falava indignado, o eficiente meganha.
Ao chegarem à Delegacia o delegado Mário Cabral, um Coronel aposentado, saudou com grande alegria àquele cidadão que ali adentrava: “Meu mestre, meu Comendador!..., a que devemos esta honrosa visita?” O homem não respondeu. Só disse: “quem sabe é esse soldado!” – apontando para Bené. “É o que, soldado! Que estória é essa?” - perguntou o surpreso Coronel. “Delegado, esse Elemento tava no beréu; bebeu, comeu e não pagou; aí..., nós truçemo ele preso.” – respondeu, gaguejando, o recente militar.
O Delegado trêmulo, pois estava mortificado de vergonha e de raiva, determinou: “vá deixá-lo no mesmo lugar onde ele estava; com as nossas desculpas.” “E a conta?” – perguntou o inocente recruta. “Diga ao David que o Comendador pode beber o que ele quiser; e pode botar na minha conta. Amanhã eu posso por lá para pagar. Vai!” – tangeu o delegado.
Ao retornarem ao Quartel de Policia, o Oficial de dia observou que o soldado Benevaldo apresentava sinais de embriaguez, tombando e com um forte hálito de bebida alcoólica. “Êi, soldado! qui parada é essa? Tá Bebo?” – inquiriu com rispidez, o zeloso Oficial. Mesmo com o detalhado relato feito por Bené, inclusive citando que ao retornarem à boate com o comendador, este, o convidou, praticamente forçando-o, a beber várias doses de conhaque de alcatrão e, portanto achava-se isento de qualquer culpa, coisa e loisa, etc., etc., etc.
“Era só e que faltava mesmo! Um mocorongo como você, que não faz nem um mês que “sentou praça”, já chegar para um seu superior, “chêi de mé” e com uma conversar fiada dessas!... Recolha-se ao alojamento, Seu porquêra! Aparece cada uma hoje em dia!...” – vociferou lívido de raiva, o exigente Oficial. O inocente Bené, que na sua estréia quis prender um Comendador, terminou sendo punido com uma semana de detimento – confinado ao alojamento dos Praças.
Para um melhor esclarecimento, o supracitado Comendador não era outro senão: o advogado, o etnólogo, o escritor, o jornalista e acadêmico Luiz da Câmara Cascudo; figura impar da nossa cidade, e, por demais, venerada no nosso País e no Mundo. Mestre Cascudo, com era mais conhecido, era um homem muito íntegro e muito ligado à família – Um homem honrado. Entretanto, como acontece com todo intelectual e boêmio, três dias a cada mês ele reservava para visitar alguns amigos, trocando com eles uns tostõezinhos de prosa; para descer aos recantos saudosistas da cidade que amava; e, por fim, para fazer umas visitinhas às primas do baixo meretrício... Assim era esse homem e assim era a sua terra...
Azar de Bené, que não o conhecia!

Natal-RN, 11/Jun./2009 - Gibson Azevedo da Costa
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