quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Imbróglios da pequena burguesia.


                                               Imbróglios da pequena burguesia

Bevé, camisa entreaberta,bebericando com amigos.

                          ...Desta triste constatação, aqueles homens e mulheres tomaram a  seguinte decisão: seus filhos seriam decentemente instruídos! Se possível nos melhores estabelecimentos de ensino, nas melhores cidades do País. Estudariam e aprenderia o que fosse possível um Ser humano aprender. Seriam Doutores!... Muito justo! Justíssimo!  No entanto, num excesso de zelo, cometeram um grave erro: o de não permitir que seus filhos trabalhassem, para não perderem tempo com os “afazeres menores”.  Ora, se o trabalho sempre honrou e dignificou o homem, por que não dignificaria  àquela geração de jovens? O fato é que, os rapazes que trabalhavam eram desprezados pelas moças das melhores famílias, pois se sabia, de imediato, que tais donzéis eram de origem muito humilde. O jovem de origem aristocrática não trabalhava!  Isto gerou, alheio a vontade dos pais, alguns exemplos de miserandos vagabundos; párias mesmo!
                                                                 
                      Agora veio-nos à lembrança a figura de Bevenuto, mais conhecido como Bevé; Breguesso, para os amigos mais chegados. Apesar do esforço do seu honrado pai, o velho Né Veras, para colocar os filhos – Bevenuto, Preto e Arnaldo(Galego Manga Larga) -  para estudar, não conseguiu afastá-los da ociosidade, da vida mansa, do nada fazer. Dentre eles, Bevé destacou-se... Cultivou o gosto pelas coisas caras, roupas finas e hábitos extravagantes; geralmente fúteis, sem que, para isto, demonstrasse o menor esforço para merecê-los. Quando o seu pai tomou conhecimento da situação, fechou-lhe as torneiras do suprimento pecuniário, tão precioso àquela doce vida. Bevé, apesar de tudo, não perdeu a pose. Longe disto! Adotou a conduta de não pagar as suas contas; agindo como se fossem coisas rotineiras e sem importância. Transformou-se no maior “um sete e um” do seu tempo. Sentia-se realizado ao burlar qualquer norma, desequilibrando, com trotes bem bolados ou grosseiros, os inocentes, os incautos.
  
O advogado José Hélio, do INSS, mais conhecido como Zé Buchinho, referia-se com frequência a um episódio ocorrido no Recife-PE, onde morava, numa pequena república, com vários estudantes oriundos da cidade de Caicó-RN. Alguns, como ele, já cursavam alguma Faculdade. Viviam, como era natural que assim ocorresse, com muita dificuldade, pegando a “xepa” na Casa do estudante; sendo, por isto, portadores de uma fome crônica naqueles meses de estudos, ausentes de seus lares e famílias. Bevé não estudava mas por lá “dava as caras” e, mesmo sem ter direito, chegou a ser xepeiro na citada Casa do Estudante. Bem, tal episódio ocorreu num domingo à noite, quando vários estudantes moradores daquela república matavam o tempo daquele insípido dia, onde o doutor “Lisêu” reinava sem adversários, absoluto, jogando cartas (pife-pafe) e bebericando uma meióta de cachaça, com farofa de sardinha aquecida na própria lata da conserva. Lá pras tantas, apareceu Bevé...  Bem vestido e perfumado, com cara de quem vinha de bons ares.
 Depois de cumprimentar todo mundo e tendo feito as festas de praxe, foi-lhe oferecido uma dose de cachaça com um pouco de farofa. Bevé, boçal ao extremo, agradeceu, declinando o convite, pois, segundo afirmava, só estava ali de passagem e que acabara de jantar uma lagosta regada a vinho no tradicional Restaurante Savoy. Ficou a conversar alguns minutos, até que, num dado momento resolveu tomar a tal dose, já que para isto não precisaria pagar nada. Sorveu-a de um só gole. Mas, a “mardita” ficou atravessada entre a boca e o estômago, numa arenga medonha com a sopa que ele havia “defendido” há poucas horas na Casa do Estudante. Naquela luta inglória, Bevé saiu perdendo, pois devolveu de imediato todo o conteúdo estomacal, ali mesmo, junto aos companheiros. Zé Buchinho lembrou que estava presente um sujeito rouco, que apesar disto, falava alto e não gostava de quem contava vantagens. Neste momento, este indivíduo pegou um palito dental e começou a remexer o vômito, comentando: “cenoura..., chuchu..., batatinha..., pimentão..., macarrão...” “Huuunrrum...! Cadê a lagosta, Bevé?”
A gozação se fez à solta naquele resto de noite, entrando pela madrugada de conhecida e fria cruviana...


Natal-RN/fevereiro de 2001.
           Gibson Azevedo – Seridoense, com orgulho.

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