segunda-feira, 27 de junho de 2011

As cinzas ainda estão quente... Ato II.


                             ...Também nos deu notícia de Seu Nascimento Ricardo, rurícola residente no Sítio Cachoeiras do Município de Jardim do Seridó-RN, lá pras bandas  da década de sessenta. Naquela época, o velho Nascimento já octogenário, testemunhara, havia muitos anos, à revelia de sua vontade, a falência da sua preciosa virilidade. Ficou triste por algum tempo, porém, o jeito foi se conformar.  Era , entretanto, um incurável saudosista...
                              Quando Jovem, gostava de frequentar o “Frege”, nos dias de Feira, pra se desmantelar com as Peixas.  Depois, quando envelheceu, não perdeu o hábito de semanalmente vir à rua aos sábados, agora já em companhia de uma das filhas, para comprar os gêneros de primeiras necessidades e, manter contato com a civilização proseando com os amigos. Era rotina: vinham ele e a filha até a Loja do Sr. Manoel Paulino dos Santos Filho, pai de Carlinhos, onde cumprimentavam a todos e, com a ajuda dela, acomodava-se em uma cadeira de balanços, descansando o corpo da fadiga acumulada ao longo dos anos. A filha saía às compras e ele ficava aos cuidados dos compadres e diletos amigos.
Foto do velho cabaré O Bataclan em Ilhéus - Bahia(agora restaurado).
                              Carlinhos, quando solteiro, tinha a fama de ser muito namorador; raparigueiro, para ser mais claro... Assim sendo, Seu Nascimento gostava muito de trocar umas ideias com aquele moço. Na conversa, desconversava..., desconversava..., e lá pras tantas perguntava: “Carlim! E as peixas?” Naquela pergunta estava implicitamente contida, todo tipo de curiosidade possível a respeito das meninas da zona do baixo meretrício. Carlinhos, para satisfazer a alma inocente daquele bondoso homem, caprichava nos detalhes, muitos deles fictícios, enaltecendo a beleza e os dotes físicos dalguma cabocla mestiça, amostra genuína das flores silvestres que enfeitam os campos da nossa juventude.
                              “Olhe Seu Nascimento!” – dizia ele -, “chegou, essa semana uma neguinha de Santa Luzia..., qué a coisa mais linda do mundo!” “Ela tem as pernas roliças, meio compridas, os seios duros, o umbigo miudinho e, um pé de barriga bem lanzudinho!” “ E o rosto?, ta certo que o cabelo é meio duro, mas o rosto é uma beleza...: sobrancelhas largas, olhos negros e grandes; a boca e o nariz são um pouco chaboqueiros, mas os dentes são bonitos.” “Bem alvinhos!” “É daquelas negrotas que, quando andam(caminham), remexem, mesmo sem querer, as cadeiras de cima a baixo.” “Só vendo, Seu Nascimento, pra poder acreditar!...”
                              À medida que ia ocorrendo a narrativa, o velho permanecia muito atento com os olhos arregalados, e para não perder nenhum detalhe, aproximava-se, esticando o tronco e o pescoço, dando a impressão que levantar-se ia da cadeira. Quando chegava ao clímax da estória, ele, já muito nervoso, não se aguentando mais, sacava do bolso traseiro de sua calça, um lenço tosco, desbotado e amarrotado e o levava ao rosto pejado de rugas, enxugando furtivas lágrimas, produto de uma imensa e incontrolável saudade.     
                            Era assim..., ocorria sempre.

                            Natal-RN, 04 de setembro de 2002.
                                          Gibson Azevedo.
                        

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